Alvos do projeto precisam comparecer a 20 reuniões no ‘E agora, José?’; muitos estão ressentidos e culpam a lei por Luiza Souto e Silvia Amorim SÃO PAULO – “Simplesmente, num momento de raiva, xinguei minha ex-mulher e agora estou aqui. A mulher sempre é a vítima. Ela coloca isso na cabeça e usa contra a gente”, reclama o pedreiro João, 50 anos, em sua primeira reunião no grupo “E agora, José?”, em Santo André, no ABC Paulista. Criado em 2014, o projeto acompanha autores de violência doméstica contra mulheres. Como a maioria que debuta no encontro, João passou as duas horas de uma das reuniões que O GLOBO acompanhou negando a agressão e atacando a Lei Maria da Penha.   — Meu primeiro casamento foi tranquilo porque ela não era metida com a Justiça. Já dessa, deixei estudar Direito, ficou entendida das leis e deu nisso. Criei uma cobra — continua ele. O psicólogo Paulo Cagliari, um dos cinco profissionais que acompanham o encontro, interrompe e faz um alerta: “Seu discurso está impregnado de machismo”. Mas o homem insiste: — Qualquer bicho manso, se cutucado, ataca. É a defesa dele. Não estão brigando por direitos iguais? — questiona o pedreiro. André, de 23 anos, tenta acalmar os ânimos. Ele alega que também não fez nada, que está ali “por uma armação da companheira”, mas, admite, precisou de cerca de 13 encontros para enxergar que sempre foi explosivo: — Não fiz nada. Ela que inventou um B.O. (boletim de ocorrência), mas hoje entendo que é preciso um trabalho assim desde cedo. O homem precisa aprender que a força dele é maior que a da mulher. Cada agressor é obrigado a comparecer a 20 reuniões para amenizar a pena. Eles são encaminhados por decisão da Justiça, sob fiscalização da Central de Penas Alternativas. Cinquenta e três homens já passaram pelo projeto, uma parceria da Secretaria de Políticas para as Mulheres com o Tribunal de Justiça de Santo André e a Secretaria Estadual da Administração Penitenciária. Publicidade O perfil é variado. Há advogados e policiais, entre outros, com idades entre 22 e 72 anos. Casos mais graves, como homicídio ou tentativa de homicídio, não são incluídos. Francisco, de 26 anos, prestes a concluir os encontros, fica no canto da sala, calado, enquanto brinca com a aliança na mão direita. Ele se casa no fim do ano, após um namoro de sete anos terminar com o braço da ex roxo. — Ele me contou que agrediu a ex. Fiquei bem chateada, mas não podia largar mão. Ele falou que queria mudar e resolvi ajudar. Durante todo o tempo em que estamos juntos, nunca me xingou nem levantou a voz. Quando eu começo a discutir, ele diz que não está a fim e sai. Ele realmente mudou — conta a namorada do rapaz. Fonte: site O Globo, disponível em: http://oglobo.globo.com/brasil/criei-uma-cobra-diz-homem-submetido-programa-voltado-para-agressores-19777644]]>