As escalas de policiais variam entre a Polícia Militar de um Estado e outro. Em alguns casos, são diferentes até mesmo entre batalhões de um mesmo Estado. Mas, segundo José Vicente da Silva e a cientista política Dayse Miranda, coordenadora do Grupo de Estudo e Pesquisa em Suicídio e Prevenção, uma parceria da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) com a PM fluminense, algumas das mais comuns são:

  • 8 horas de trabalho em um dia seguido por outro dia de 8 horas de trabalho e folga de 40 horas
  • 12 horas de trabalho seguidas por 40 horas de descanso
  • 24 horas de trabalho seguidas por 48 horas de descanso
  • 12 horas de trabalho com descanso de 24 horas, seguida por mais 12 horas trabalho e descanso por 48 horas
Na avaliação de José Vicente da Silva, as escalas que fazem com que o policial trabalhe mais do que 12h e descanse por longos períodos não têm justificativa operacional. Mas como liberam os policiais por dias inteiros, servem para viabilizar que exerçam atividades remuneradas fora de seus horários de trabalho oficial e complementem seus salários. Pontos a favor dos bicos oficiais Complementação de renda Os ‘bicos oficiais’ são uma forma por meio da qual policiais garantem a complementação de sua renda. No caso da Operação Delegada, por exemplo, cada policial pode trabalhar até 80 horas mensais além de sua jornada normal. Com isso, pode receber até R$ 1.700 a mais por mês frente um salário oficial de cerca de R$ 2.900. Liberdade Robson da Silva avalia que parte dos policiais militares tende a recorrer a trabalhos fora de seu horário de trabalho mesmo nos momentos em que têm aumentos salariais. Apesar de ser crítico a esse tipo de trabalho extra, ele afirma que ele é, em geral, exercido por vontade própria dos policiais. ‘Como a folga é no tempo dele, ele faz o que quiser’, afirma. Ele ressalta que o RAS compulsório é uma exceção. Segurança Quando não tem ‘bicos oficiais’ como opção, o policial militar que deseja trabalhar busca frequentemente vagas de segurança de empresas privadas, como casas noturnas e comércios. Esse tipo de atividade representa um risco maior porque nele os policiais agem sozinhos e não têm o apoio do Estado, diz Silva. Em 2011 a Polícia Militar de São Paulo afirmou ter uma avaliação similar. A entidade disse que a Operação Delegada, instituída dois anos antes, havia contribuído para a queda do número de policiais mortos fora de serviço. Pontos negativos dos ‘bicos oficiais’ Falta de investimento Para Dayse Miranda os ‘bicos oficiais’ são uma forma encontrada pelos governos de aumentar o efetivo nas ruas gastando menos, já que não precisam realizar novas contratações e treinamentos. No caso do Rio de Janeiro, ela avalia que o RAS compulsório, que obriga os policiais a venderem seu tempo de descanso, viabilizou a expansão das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), a presença policial nos protestos de 2013, a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016. Dificuldade em se planejar Como podem ser convocados a qualquer momento no caso do RAS do Rio de Janeiro, os policiais têm dificuldade de planejar as próprias vidas, aumentando seu estresse, afirma Miranda. Para ela, é patente que o trabalho extra compromete a saúde dos policiais. ‘Mas a questão do descanso do profissional não está na agenda da segurança pública.’ Risco maior Miranda diz que os ‘bicos oficiais’ naturalizam a ideia de que o policial é ‘uma máquina’, que pode trabalhar de acordo com as necessidades que surgirem. Mas essa é uma avaliação perigosa porque o excesso de trabalho prejudica o desempenho. ‘Estamos falando de um profissional que carrega uma arma. Não é só uma questão de saúde do policial, é de segurança pública’, diz. ‘Os erros do policial ou caem na conta dele mesmo ou na da falta de treinamento. Mas se o policial não tiver condições de descanso para ter discernimento, temos mais casos de erros em ação e mortes’, afirma Miranda. Estresse pós-traumático O coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo e psicólogo clínico Olavo Sant’Anna Filho pesquisa estresse pós-traumático de policiais militares. Entre os sintomas da doença estão: não conseguir controlar pensamentos negativos sobre o evento, flashbacks, pesadelos e ansiedade extrema. Ao Nexo, Sant’Anna afirma que a falta de descanso contribui para o problema, já que este não depende de um único evento traumático, mas pode surgir com o estresse acumulado durante anos. Tira o foco dos salários Para Sant’Anna, os ‘bicos oficiais’ são uma forma ruim de possibilitar que o policial aumente sua renda. ‘O ideal seria que tivesse um salário que permitisse prover todas as atividades de sua família’, diz. FONTE: site  Nexo, disponível em: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/01/23/Os-%E2%80%98bicos-oficiais%E2%80%99-dos-policiais-quais-s%C3%A3o-os-argumentos-a-favor-e-os-contr%C3%A1rios]]>