Por Diógenes Júnior, especial para o Portal Vermelho e Jornalistas Livres.
No momento em que escrevo essas linhas um grupo de estudantes ocupa a Escola Estadual Fernão Dias Paes, em São Paulo. O “Fernão”, como é conhecida no bairro, é uma das escolas programadas para ter o Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) fechado a partir do ano que vem pelo governo do estado de São Paulo.
O governo que esconde da população os atos obscuros que pratica, ocultando informações sobre o Metrô; o governo que esconde da população dados estatíticos sobre as mortes cometidas por policiais militares fora de serviço, policiais que pertencem a uma corporação que, segundo a própria corregedoria da Polícia Militar, “é uma corporação que tem entre seus quadros uma organização criminosa que se organiza em grupos de extermínio”.
No momento em que escrevo essas linhas viaturas e soldados da Polícia Militar já cercam a Fernão – porque quando o objetivo é atacar alunos e professores, cidadãos comuns, indefesos e desarmados, alguns policiais militares se apresentam com velocidade e eficiência extraordinárias, inversamente proporcionais à que apresentam cotidianamente quando deveriam combater criminosos.
Na contramão da História e antagonizando o slogan do governo gederal – Pátria Educadora, o governo do estado de São Paulo, na figura do governador Geraldo Alckmin e seu secretário de Educação – Herman Jacobus Cornelis Voorwald – têm promovido um desmonte implacável do ensino público estadual.
São políticas absurdas e autoritárias que têm como objetivo central desvalorizar a carreira dos professores, desestimular o ingresso de novos quadros na rede pública do estado, aumentar o número de alunos dentro de uma mesma sala de aula, fechar unidades escolares e transferir para o município o que é obrigação do governo estadual.
Tudo isso feito sob a desculpa de uma reestruturação que não se sustenta no plano real, apenas nos planos perversos de seus articuladores.
Através da leitura dos livros de Soren Kierkegaard aprendi que “a vida só pode ser compreendida olhando-se para trás, mas só pode ser vivida olhando-se para frente”.
“Olhando para trás”, conforme a orientação do filósofo dinamarquês, recordo-me de meus primeiros dias de aula no longínquo ano de 1979, aluno do pré-primário no ano que a ONU proclamaria como o “Ano Internacional da Criança”.
Naquele ano ainda pesava sobre o povo brasileiro a mão do ditador presidente João Batista Figueiredo, e sobre o povo paulista a mão do governador biônico Paulo Maluf.
Olhando para frente, ainda conforme a orientação do filósofo, vejo a mão autoritária do governador de São Paulo pesando sobre o povo paulista e desmontando toda a rede pública de ensino, dificultando não pouco a vida de milhares de alunos e professores.
Assim como eu, Geraldo Alckmin certamente leu Kierkegaard, mas pela política de ensino que tem praticado dá mostras de que deu atenção apenas a uma frase do teólogo e filósofo:
“a tarefa deve ser tornada difícil, visto que apenas a dificuldade inspira os nobres de espírito”.
Mas é claro que não há nobreza de espírito alguma nesses atos do governador, nem tampouco é alguma nobreza que ele visa inspirar.
O que se vê é apenas a clara intenção de sucatear todo o ensino público para posteriormente entregá-lo à iniciativa privada.
A tarefa que Geraldo Alckmin quer tornar cada vez mais difícil é a tarefa básica e essencial para todo aluno e professor da rede pública estadual: respectivamente o direito de estudar e o direito de lecionar.
No início deste ano foram eliminadas mais de 3 mil salas de aula em todo o estado. Li notícias sobre escolas com mais de 50 alunos por sala de aula. Algumas com 90 alunos por sala, conforme denúncia da Apeoesp.
Em todos os protestos na Avenida Paulista contra a “reestruturação” imposta pelo governo Alckmin, a Polícia Militar que está sob seu comando direto intimidou, ameaçou, bateu, prendeu e jogou spray de pimenta no rosto de alunos e professores.
Duvido que algum desses policiais algum dia teve em suas mãos um texto de Kierkegaard, mas a despeito disso acredito que todos levam muito a sério, assim como seu comandante, Geraldo Alckmin, “a tarefa de tornar difícil” a já difícil tarefa de estudar, de lecionar ou de simplesmente viver dos professores e alunos da rede pública de ensino do estado de São Paulo.
*Diógenes Júnior é estudante de Ciências Sociais, pesquisador independente, militante do PCdoB, ativista dos Direitos Humanos e Jornalista Livre.
FONTE: site Portal Vermelho, disponível em: http://www.vermelho.org.br/noticia/272617-10]]>